Gênesis - Parte II


           Não passou-se muitos dias da volta de Ângela e logo Susan anunciava que partiria juntamente com Flourbe e aquela mulher nova. E como parece que sempre acontece, Stanner ficaria encarregado de cuidar e manter a casa.
            – Nossa viagem provavelmente será mais longa que o esperado, portanto nos comunicaremos menos que o costumeiro. Douglas seguirá como responsável legal da casa Harks, em minha ausência. Cláudia, continue suas pesquisas. Tudo o que conseguir averiguar será de grande valia. Catherine e Suzanne, continuem seus trabalhos com Marie. Ela logo se acostumará com os ocorridos de nosso lar. – ela olhou-me com um sorriso afetuoso. – E Ângela, permaneça alerta.
            A alta moça alva e loira, que estava junto a janela, apenas acenou afirmativamente com a cabeça.
            Após a reunião, Ângela saiu da biblioteca seguida da mulher desconhecida. Olhando as duas com mais cuidado, percebi alguns traços de semelhança. Apesar dos tons diferentes de cabelo e olhos, o porte, a altura e a leveza com que andavam, sem tocar realmente o chão emadeirado, tudo era similar...
            Não houve mais despedidas. O portão de ferro abriu-se e a carruagem partiu.

***

            – Vocês são muito parecidas.
            – O quê? – Ângela virou-se para mim, com ar de surpresa. Parecia que seus pensamentos não estavam naquele local.
            – Vocês são parecidas. Reparei ontem. Você e aquela outra nova.
            – Ah... Sim...
            Olhei atentamente. Aquela mudança leve de posição corporal e o intervalo de análise do pensamento, antes de as palavras saírem da boca.
            Ela não é burra...
            – Sim, eu sei. – respondeu Ângela para o nada.
            – Você poderia saciar essa curiosidade dela. – disse Catherine, à porta.
            – É uma história antiga e desinteressante. – replicou Ângela.
            Dois lados da moeda...
            – Duas versões da história, você quer dizer.
            – Ah... O.K... Alguém pode me explicar isso? – perguntei sem entender o que acontecia.
            – Agora não posso. Há algo que devo fazer. – disse Ângela retirando-se da sala.
            Olhei para Catherine, mas ela deu de ombros, retirando-se em seguida. De repente, parou e voltou-se com um olhar reprovador.
            Divinas escusas, sempre!

***

            Os olhos dela são curiosos...
            – Sim. A tenra idade enche-a de vontade de conhecer o novo, o diferente.
            Curiosidade pode ser bom...
            – Mas pode ser ruim. Nós somos exemplo disso.
            Não foi tão ruim...
            – Depende do ponto de vista. Para nós, pode não ter sido. Mas cada espécime é diferente.
            Você teme por ela...
            – Sei que ela chegará a nossa verdade.
            Torne o caminho mais confortável...
            – Refletirei sobre isso.
            Reflita... Ou eu...

***

            – Ângela?
            – Marie, agora não! – disse a mulher loira sem virar-se para mim.
            – Mas você aparentemente não está fazendo nada e...
            – Saia!
            – Eu... Só queria conversar.
            – Sente-se! – sua voz mudou, ganhou outro tom, uma melodia mais suave, mais sedutora. – Você quer conversar sobre o que, minha menina?
            – Essa não é você! – disse assustada – Quem é você?
            – Eu sou o outro lado da moeda... A morena... A noite...
            – O quê? O que você quer dizer? – estava pasma.
            – Você sabe... – de repente, a voz mudou novamente e, agora, voltava a ter a mesma melodia lírica de sempre. – Marie, deixe-me sozinha.
            Não questionei. Aquilo tudo era muito estranho. Apenas retirei-me da biblioteca.

***

            – Bom dia, doutor Stanner.
            – Bom dia. – sua resposta era apática como sempre. Só o vi sorrir e melhorar seu ânimo nos dias em que Susan esteve na casa.
            O advogado estava afundado na poltrona à esquerda da lareira. Em suas mãos havia papéis amarelados pelo tempo. Lembranças, pensei.
            Logo a sineta tocou anunciando que o café estava servido. Costumes estranhos que ainda permanecem nessa casa... Sineta... Meus devaneios trouxeram-me um sorriso aos lábios.
            Quando voltei a mim, olhei em volta, assustada. Não... O leitor não está aqui. Respirei aliviada e segui pelo corredor de estátuas até a sala de jantar.

***

            – Vocês devem ter cuidado. A noite está mais escura a oeste nas duas últimas luas cheias.
            O que você vê?
            – Eis o problema, não vejo. Por isso peço que tenham cautela. Ela pode estar por perto.

Comentários

Segue a gente no Facebook ;)

Seguidores

Outros textos que você pode gostar