A garota francesa - parte I


– Gostando do bolo?
– Uhum... – murmurou a garota. Seus longos cabelos negros caindo sobre o rosto, os olhos ganhando brilho e a boca mexendo-se desenfreadamente.
Estávamos em um modesto café, localizado em uma discreta rua da capital francesa, depois de meses de observação e algumas longas semanas de ocasionais encontros. Tudo meticulosamente pensado, para poder aproximar-me dela sem uma forte rejeição... Digo forte rejeição, porque ela é desconfiada... E muito... Algo compreensível quando se entende minimamente pelo que ela passou.
– Como você me encontrou?
– Falar enquanto come, é feio.
– Uhum... – concordou – Mas você não me respondeu.
– Estou intrigada com você...
– Por isso está me seguindo?
– Por que aceitou meu convite?
– Gosto de você... Você não me fará mal... Sei disso.
– Como você sabe?
– Meu faro me diz... – sorriu, deixando aparecer seus dentes salientes – E se você quisesse me fazer mal, já teria feito.
– Então você confia em mim?
– Não disse isso!
– Mas também não desconfia a ponto de se afastar...
– Quero outro bolo.
Acenei para a garçonete, que prontamente veio, e pedi outro pedaço de bolo de morango.
– Querem mais alguma coisa? – Perguntou educadamente.
A garota acenou um não com a cabeça, que foi seguido pela retirada da garçonete.
Pouco demorou até que seu novo pedaço de bolo chegasse. Imediatamente, ela pôs-se a mastigar.
– Queria conhecer onde você mora.
– Para quê?
– Já lhe disse, estou intrigada com você.
– E o que o lugar onde moro tem a ver com isso?
– Quero entender quem é você.
– E se eu não for alguém interessante de se conhecer?
– Quem irá decidir isso sou eu, e não você.
– Você é realmente muito estranha...
– Você acha?
– Claro! Você persegue uma desconhecida por meses... Um belo dia a convida para um café... E ainda diz que quer conhecer sua casa... – seu olhar tentava ser intimidador... Foi então que ela soltou a ideia mais absurdamente engraçada que já havia ouvido – Você não é pervertida, é?
Não pude me conter e ri alto... Fui levada à beira de uma crise de risos... Nunca havia passado por minha cabeça ser chamada de pervertida... Nunca, em toda a minha existência... Isso era característica de minha irmã, não minha...
Quando finalmente consegui me controlar, minha barriga e minhas bochechas doíam. Lágrimas, resultantes do esforço que minha forma humana havia acabado de realizar, escorriam por meu rosto.
– Só queria me certificar... Já vou logo avisando que não sou desse tipo...
– Que pena! Porque você desvendou minhas intenções... – não pude conter mais uma sequência de risos e precisei de alguns minutos para me acalmar novamente. – Vamos! Termine seu bolo. Quero conversar com você em um local onde se sinta mais à vontade.
– Isso realmente soa muito esquisito... – disse ela, enquanto terminava de mastigar.
Deixei algumas cédulas sobre a mesa e nos retiramos dali.
As ruas eram calmas... Andamos lado a lado, em silêncio. Eu a guiava ao local que sabia ser seu esconderijo, mas o caminho que fiz era mais longo que o habitual. Queria que ela não percebesse minha intenção.
Finalmente chegamos a um beco. No final dele havia uma porta, a qual dava para o porão não utilizado de um prédio de três andares. Era a casa dela.
– Você deu essa volta toda para chegar aqui?
– Entre!
– Quais são suas reais intenções comigo?
      – Entre!

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