Floresta Negra - Parte II
Foram dois dias de caminhada,
em companhia de frio e de denso nevoeiro, até avistarmos construções. Algo me
dizia para não nos aproximarmos. Mas essa não foi a escolha dos outros e como a
maioria sempre vence... Eu, particularmente, não teria problema nenhum e até me
divertiria com travessuras, mas,
quando decidi unir-me a esta empreitada, tive que abandonar alguns hábitos
adquiridos.
Quando conseguimos nos aproximar da vila, já era noite. Tudo
era escuro e a névoa alertava o local sobre nossa chegada. Nenhuma luz vinha de
parte alguma daquele lugar. Mesmo assim, batemos à porta de uma das casas e,
sem haver retorno de nosso cumprimento, adentramo-la. Era um recinto amplo, de
pedras negras, igual a fachada. Em seu interior não havia nada, nem ninguém. A
casa estava completamente deserta.
Decidimos, então, passar a noite lá e partir na manhã
seguinte. Utilizamos nossas pequenas bagagens como apoio para a cabeça e
aconchegamo-nos da melhor maneira possível naquele chão gélido de pedra.
Foi uma noite turbulenta. Todos tiveram sonos
conturbados, sonhos estranhos e a sensação constante de sermos observados. Meu instinto
estava certo, aquele local não era seguro. Algo viria com o sol...
A névoa, em alguns pontos, foi devolvendo-nos a
liberdade, apesar de o frio prosseguir em nossas entranhas. Saímos da casa e
fomos investigar a vila como um todo. Todas as outras moradias estavam
igualmente abandonadas. Aquele local era um deserto.
Foi um pouco antes de chegarmos ao fim das construções
que fomos surpreendidos por um elfo negro. Seu capuz podia esconder seu rosto,
mas sua estatura e desenvoltura não poderiam enganar meus olhos de noctívaga. Ele
aproximou-se cauteloso. Seu olhar era investigativo, mas sabia exatamente o que
procurar. Olhou-nos detalhadamente, não falou palavra e seguiu seu caminho.
Não nos preocupamos com ele, nossa ânsia era outra. Em nosso
íntimo, torcíamos para que quando voltássemos à floresta, encontrássemos nossa
trilha. Infelizmente, ao adentrarmos novamente o mundo denso daquelas árvores, nada
mudara. Continuávamos a não encontrar nosso caminho. Éramos novamente forçados
a mudar nossos planos.
Procuramos,
então, um local sombreado e discreto, onde pudéssemos esperar o anoitecer. Tentaríamos
evitar caminhar de dia, pois a sensação de sermos observados perdurava e algo
me dizia que o encontro de mais cedo não fora um acaso.
Susan não
se sentia incomodada com o sol daquele lugar. A floresta permitia que ela
andasse normalmente durante o dia, suprindo suas necessidades de alimento
quando fosse necessário. Achei que seria complicado já que não víamos muitos
animais, mas ela saiu-se bem... Pelo menos aqui, no meio do nada, ela não
precisava esconder quem era...
Flourbe,
por sua vez, tinha um bom conhecimento daquela floresta e sabia o que podia
servir-lhe de alimento. Pareceu-me que o local não havia mudado muito desde os
tempos em que ele vivera por esses arredores.
Quando
a mim, você sabe... Abneguei essa fraqueza humana e como ser divino que sou,
não preciso alimentar-me. Portanto, segui minhas horas observando-os e
deliciando-me com as necessidades mortais.
***
Mais uma vez deixamos que o sol surgisse e se fosse.
Susan estava sozinha no centro de uma clareira,
observando a lua cheia que surgia alta. Flourbe estava mais à esquerda,
analisando as posições das estrelas que, agora, se mostravam mais brilhantes. Aproximei-me
dela e ficamos em silêncio, observando a abóbada celeste cair em breu, com
apenas a lua e as estrelas reluzindo o que restara do astro dormente.
O homem terminou suas observações e indicou para que seguíssemos
viagem. Nesse momento, percebi um retângulo em couro envelhecido que Susan carregava.
Já o havia visto antes.
Com dr. Stanner.
O diário de Richard Thompson.
Sim. Ele deu-a
antes da viagem. Talvez já previra o que lhe ocorreria...
Ela ainda não o leu.
Ela ainda não está
preparada para reviver determinadas lembranças...
Lembranças que a levarão a recordar do vampiro...
***
Caminhamos por mais cinco dias por entre aquela floresta
fechada. Em meio a momentos em que nem o vento era ouvido. Outras vezes, nosso
caminho era cortado por grunhidos altos, uivos e movimentos, ora próximos, ora longínquos,
atrás das sombras da mata. Apesar de tudo, não parávamos. Não éramos perigo
para eles, nem eles para nós, pois a sensação de sermos observados cessara a
dias.
De repente, algo nos chamou às nossas costas.
– Vocês, o que procuram?
– Quem é a senhora? – adiantou-se Susan.
– Sou alguém que mora aqui.
– Então, é a senhora que procuramos, senhora Lavreur. –
concluiu a vampira.
– Sabem quem eu sou, mas não sei quem são ou o que
querem!
– Somos aqueles que procuram sua ajuda para encontrar alguém.
– explicou Miss Harks.
– E quem querem encontrar?
– Uma necromante. – respondeu Flourbe, temendo que Susan
falasse algo que não devesse. Grande cautela era necessária, principalmente com
o nome de que buscávamos.
– Venham comigo!
Comentários
Postar um comentário