Ascensão do Sol Pálido

 


Eu já senti que as coisa não estavam normais quando acordei. O calor do dia estava diferente. Era um calor… Sem calor, como se fosse um dia nublado, mas sem chuva.

Levantei ainda meio sonolento, cambaleei até o banheiro para lavar o rosto e limpar os olhos. A vista foi se ajustando ao meu estado de acordado, formando as imagens com mais nitidez a medida que eu me habituava com a luz.


Foi ai que eu notei.


As luzes.

Elas não tinham cor.


Tudo que eu via era em tons de cinza. Olhei para minhas próprias mãos. Eu sou negro, mas minha pele estava acinzentada. Meus quadros, minhas fotos, meus funko pop, nada ali tinha cor. Era como se um filtro de cinema antigo tivesse sido colocado sobre os meus olhos.

Eu corri para a cozinha para ver minha família. Estavam todos sentados a mesa, tomando café da manhã. Minha mãe servia o café para meu pai, enquanto minha irmã passava manteiga em uma fatia de pão sovado. Seus rostos… Suas expressões…


Vazias.


Eu gritei: “Gente, eu to vendo tudo em preto e branco! O que tá acontecendo?”


Minha mãe respondeu: “Nada”.


“Como assim, nada?” eu retruquei. “Meu deus, o que tá acontecendo com vocês? Estão aí, parados, como se nada estivesse rolando? Alguém me explica!”


“Não tem nada acontecendo, meu filho.” - meu pai. Ele continuou bebendo seu café, sem sorrir, sem coçar a barba, sem fazer nada do que eu sei que ele faz, e que faz dele ser o meu pai. Ele não piscava.


Ninguém reagia a nada.


Eu não sabia mais o que fazer.


Eu fui até o meu quarto. Sentei na cama sem entender nada. Num impulso, fui até a janela para ver o que tava acontecendolá fora.

O sol. Tinha alguma coisa errada com o sol.

A luz dele era pálida. Sem cor. E ele pulsava, como um coração, e cada pulsar emitia mais daquela luz sem cor, sem brilho, sem calor.


Um sol morto pulsava no céu.


De repente, comecei a me sentir sem forças. Os músculos pesados, as pernas doloridas. Esforcei-me para fechar a janela. Sentia a energia, a vitalidade, esvaindo pelos meus poros, toda minha vontade, abandonando meu corpo.

Aquele sol… Estava drenando meu espírito.




Eu fui até o guarda-roupas. Peguei uma camisa bem engomada, uma calça jeans e um sapato social. O sapato era desconfortável. Vesti-me e sentei à mesa com meus familiares, que terminavam seu desjejum.

Comi e tomei café. Estava tudo muito ruim e frio, mas o gosto da comida não importa. Escovei meus dentes e peguei minhas coisas.


Abri a porta de casa. As pessoas andavam em silêncio nas ruas. Seus rostos expressavam nada. Rostos iguais.


Não importa.


Eu preciso ir trabalhar.

Comentários

  1. O que significa um mundo sem cores? Não importa, eu preciso trabalhar.

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