Véu de estrelas

A culpa é difícil de ser reconhecida. Manuel a chamava de anja, quando tudo o que ela mais queria era ser um demônio. Sonhava com atenção, com amores e aventuras. Ela queria ter a vida diferente da maioria das mulheres de sua família e das outras que viviam naquele lugar. Era de Marte e não nascera para ficar num canto, à margem. Queria mais. Mais do que achava que ele poderia oferecer.

Se conheceram numa terra de três climas, seu encontro fora nas gélidas montanhas. Manuel era um homem acuado, quieto, que tinha um sorriso que era seu atributo físico mais eminente. Quando de seu primeiro encontro não houve amor à primeira ou à perca de vista. Ela só o escolhera depois, apesar de que ele já havia escolhido ela muito antes, desde o primeiro olhar. 

Os olhos dela o conquistaram. Ela só conhecera seu valor depois, ao descobrir sua nobreza, sua masculinidade que não a anulava. Ele a respeitava e não a tratava apenas como mais uma garota para abandonar, para provar. Os beijos no véu de estrelas, as voltas em velocidade desafiando o ar e a água, o escuro dos seus olhos e da noite, a esperança de não viver sozinha em seus pensamentos. Ela descobriu o amor, sem saber que o sentia. Seria amor por ele ou pelos momentos que ele proporcionava? Seria amor pelo homem ou pela mulher que ela descobria poder ser? O pior do poder é não ter controle, sempre desejar mais, a ponto de não conseguir parar. Ela tinha um vício que temia carregar para o resto da vida, ela sempre queria mais. E junto com isso a sua maior maldição: não aceitava perder. 

Ele se foi numa noite em que ela não reparava as estrelas, mas os deuses. Ela os amava. Ela os queria. Morgana sempre queria demais, nunca aprendia os limites de seus anseios e nem do amor que podia ter. No fundo ela era o próprio Marte, egoísta, vaidosa, sem temor. Ele feneceu com o (des) amor da divindade. Não há espaço para amor onde não há compreensão. Ela o afastou, o perdeu quando achou que nunca perderia. E não aceitou. Para não passar a vergonha, jogou-a para ele e o afundou em tristezas. A jovem tola achava mais fácil culpar o outro, ela não o perdoou e nele jogou todas as ideias ruins e intragáveis daquela perda. Ela seguiu com seus muitos amores. Ele matou a saudade, sentindo saudade por outra.

Em seus sonhos mais tortos ela ainda sonha com o véu de estrelas sobre seus corpos, com as cachoeiras como testemunhas de seus recíprocos toques e com a floresta como testemunha da luxúria de seus corpos.


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